terça-feira, 13 de setembro de 2011

José Mojica Marins, o Zé do Caixão morou na Vila Anastácio

1938 - 1950: Vila Anastácio
Trecho de: Maldito – A Vida e o Cinema de José Mojica Marins, o Zé do Caixão
(André Barcinski e Ivan Finotti; Editora 34; 448 páginas) 

Aos 11 anos, ele ganhou de seu pai uma máquina fotográfica e criou uma espécie de cineminha de terror, inspirado no famoso "Bat-sinal" de Batman. O truque era simples: ele tirava fotos com filme preto-e-branco, mandava revelar o filme e colava os negativos na boca de uma lanterna de mão. Depois ia para algum lugar escuro e projetava a luz da lanterna numa parede branca, o que dava às imagens uma aparência fantasmagórica. Quando não havia sessão no Santo Estevão [na rua Martinho de Campos na Vila Anastácio bairro da zona oeste da cidade de São Paulo ], Antônio deixava o filho projetar as imagens na telona do cinema
(...)
Cine Sto Estevão
de Vila Anastácio
 Não demorou para Mojica cansar-se do teatrinho mambembe que fazia com os colegas. Já se julgava um adulto. Como prova de maturidade e macheza, começou a fumar cigarros de folha de chuchu, verdadeiros mata-ratos que ele tragava numa rodinha com os amigos. Folheando uma revista certo dia, Mojica descobriu seu novo sonho de consumo: uma câmera 8 milímetros. Ele tanto insistiu com seu pai que acabou ganhando uma câmera como presente de aniversário de 12 anos. Depois disso, mal parava em casa: eram dias inteiros brincando com a máquina, ao lado de João Português, Abdul e Dinho.




Os primeiros experimentos da turma não passavam de brincadeiras de criança: filmavam o bairro, suas famílias, os vizinhos e colegas. Mojica conseguiu um projetor emprestado e exibiu seus primeiros filmes caseiros num lençol estendido em um varal no porão do cinema. Ele lembra do exato instante em que viu pela primeira vez uma de suas cenas - a fachada do Cine Santo Estevão – projetada na tela improvisada. Foi o dia mais feliz de sua vida.

A turma passou quase três anos-usando a câmera diariamente. Pouco a pouco, seus experimentos foram se tornando mais complexos. Eles ainda não tinham muita preocupação com enredo ou continuidade, mas já haviam começado a filmar cenas esparsas de brigas e perseguições. Mojica era o mais esperto do bando e foi o primeiro a descobrir os conceitos elementares de montagem. Sem dispor de um sistema de edição, ele percebeu que poderia criar seqüências de ação na própria câmera, simplesmente filmando as cenas em ordem e trocando sempre o ângulo de visão.

Assim, para filmar uma cena de briga, ele se postava atrás de um dos atores e mandava que este desse um soco em seu colega. Depois trocava o ponto de vista, filmando nas costas do sujeito que havia levado o murro. Quando projetavam o filme, a seqüência parecia fluida e cheia de movimento (infelizmente, todo esse material, filmado entre os anos de 1948 e 1950, se perdeu).

Seus filmes eram retocados à mão para que os efeitos imaginados por ele se tornassem possíveis.
O primeiro experimento da turma a merecer o nome de "filme" – ou seja, o primeiro a ter um enredo com começo, meio e fim – foi o curta-metragerri 0 Juízo Final, rodado em 1949, quando Mojica tinha apenas 13 anos. O filme contava a história de um ataque de naves espaciais à Terra. Para fazer as naves – que tinham formato de caixão de defunto – Mojica usou novamente o recurso do "Bat-sinal", colando na boca de uma lanterna uma cartolina vazada com um buraco em for ma de caixão e projetando o facho de luz numa parede. Antônio, um tremendo pai-coruja, achou o filme uma obra-prima e deixou que eles o projetassem na tela do Santo Estevão [o pai de Mojica, Antônio, era gerente do cinema Santo Estevão no bairro de Vila Anastácio, na rua Martinho de Campos, que foi posteriormente demolido para dar lugar ao estacionamento do banco Bradesco   ]. 
Igreja e cinema Sto Estevão de Vila Anastácio onde tudo começou
na vida de José Mojica Marins , o Zé do Caixão





          Foto  da igreja e do cinema Santo Estevão extráida do site Núcleo de Memória

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